Foco na Mídia

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quarta-feira, 15 de outubro de 2014

A “espetacularização” dos debates na televisão


Dilma Rousseff e Aécio Neves no debate da Rede Bandeirantes

O debate de ontem (14/10) realizado na Rede Bandeirantes foi marcado por um enfrentamento duro de dois candidatos que não se olharam nos olhos, mas atacaram e foram atacados mutuamente. A postura dos dois era digna de horário eleitoral, onde o discurso de um candidato carece de contextualização e só destaca as informações que fazem bem ao partido.

Sobrou “espetacularização da política”; faltou conteúdo, conhecimento e, no fundo, respeito com os cidadãos.

Aécio chamou Dilma de leviana depois que ela citou o Aeroporto construído em terras de seu tio, por exemplo. No entanto, quem realmente foi “leviano” foi o próprio debate de ontem! Pouco refletivo, imprudente e leve – definições de “leviano” no Dicionário Aurélio. As meias-verdades partidaristas dominaram o tempo dos candidatos e ajudaram a propagar muitas das mentiras que literalmente dominam as redes e as mentes dos eleitores nesse segundo turno.

As propostas e ideias ficaram em segundo plano; enquanto as notícias que saíram eram maioritariamente sobre os ataques realizados. Essa superficialidade gera muita audiência para a Bandeirantes – que foi líder durante da 1h30m que durou o debate -, mas não ajuda objetivamente o eleitor a escolher seu candidato.

Acontece que essa característica leviana é típica do formato da televisão brasileira, que sempre privilegiou o entretenimento e os lucros, deixando de lado a informação imparcial de interesse público e a educação – que são mais importantes em países europeus, por exemplo. Essa prioridade focada no financeiro cria coberturas políticas superficiais com destaques para corrupção e acusações bombásticas, além de telejornais baseados no entretenimento e na espetacularização da notícia através de imagens impactantes e conteúdos superficiais.

Desse foco nos lucros e nos votos surge a ”necessidade” de encontrar um vencedor dos debates televisivos – entre aspas, porque essa necessidade, no fundo, não existe. Os políticos viram atores que interpretam um papel; uma imagem moldada pelas estratégias do marketing político. Quem fizer melhor interpretação – ou seja, quem atacar melhor, transmitir segurança, confiança, caridade, força e firmeza – supostamente ganhará o debate.

Logicamente as preferências partidárias e ideológicas das pessoas condicionam os julgamentos. E essa característica subjetiva acaba com o sentido de escolher um vencedor, pois a maioria das vezes não existe um consenso que permita o julgamento objetivo.

Enfim, a postura dos candidatos espetacularizou o debate. Sendo o PT e o PSDB dois partidos eleitoralmente massificados, os cuidados para evitar deslizes são enormes. Com isso, falta espaço para propostas e sugestões, pois a introdução de uma proposta à essa altura abre campo para mais ataques do rival. 

É um círculo vicioso em que os candidatos atacam para não dizer propostas - e não dizem propostas para atacar.

Quem agradece um debate recheado de polêmica é a Bandeirantes e os jornais: tem material suficiente para chamar atenção do público.

O palco passa a ser visto como um ringue de batalha de onde surgem polêmicas a cada instante, temas que aparecem instantaneamente na imprensa e na Internet, onde as discussões políticas correm soltas. Essa possibilidade de debate nas redes sociais é um espaço para discutir ideologias e visões do mundo, mas é mal utilizada quando os próprios cidadãos incorporam os discursos ofensivo dos candidatos a seu próprio discurso e acabam limitados ao que diz o marketing político.

Por outro lado, através da exploração extrema de detalhes frívolos e espetaculares como os ataques e as meias-verdades de cada candidato, a mídia consegue ascender as polêmicas com frequência, dando mais repercussão aos seus conteúdos e conseguindo audiência, publicidade e, consequentemente, lucros.

Por isso os destaques dos debates normalmente são declarações polêmicas, ao invés de planos de Governo ou contextualizações. Trata-se de uma estratégia dos políticos, da televisão e da própria mídia no geral. É tudo por dinheiro e votos.

Ontem, Aécio usou todas suas perguntas para atacar Dilma; enquanto a petista usou a maioria das suas para comparar seu governo com o de FHC, que inspira o projeto de Aécio. É questão de estratégia para conseguir o voto de um público com conhecimento político limitado pela própria cobertura frívola da televisão e de outros canais de mídia.

Sem dúvida o telespectador pôde tirar suas próprias conclusões e os eleitores de um ou de outro candidato tem mais argumentos para atacar o rival. Mas essa postura dos debates televisivos contribui para o limitado conhecimento político dos cidadãos e não motiva um maior entendimento de temas complexos que são necessários para a inclusão política da sociedade.

Atacando e dizendo que “eu sou melhor e você mente”, os candidatos conseguem convencer seus apoiadores – que podem virar cegos e fiéis, ou seja, tudo que qualquer político deseja -, mas também incentivam o desinteresse da sociedade pela política, pois a mesma continua acreditando que esse tema só é formado por corrupção, debates, eleições e ataques entre partidos.

Ora, a política é muito mais complexa que qualquer debate televisivo. Assim como os fatos são muito mais heterogêneos do que as notícias televisivas mostram.

Claro que a “telinha” permite a transmissão de reportagens profundas e de documentários muito bem contextualizados que de fato aumentam o conhecimento do telespectador.

Mas, como dito antes, a televisão é movida pelos lucros; e para lucrar é preciso audiência; então o formato televisivo naturalmente aponta para uma direção em que intenção de informar o cidadão fica na geladeira, enquanto a prioridade de qualquer rede de televisão do Brasil vira a busca de audiência, de publicidade e de uma audiência que compre os produtos da publicidade.


Para a TV, portanto, quanto mais espetaculares sejam os debates, melhor. 

O debate de quinta-feira no SBT não será diferente.

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