Foco na Mídia

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quinta-feira, 25 de setembro de 2014

O Confronto de direitos fundamentais nos comentários de Sheherazade



O Ministério Público opinou pela denúncia contra o SBT pelos comentários de Rachel Sheherazade no caso do menino amarrado em um poste no Rio de Janeiro. 

A ação ainda não foi aceita por um juiz, mas as redes sociais já dão uma enorme repercussão à decisão do Ministério Público.

Trata-se de um tema polêmico que envolve Direitos Fundamentais de partes contrárias.

A liberdade de expressão da jornalista é o argumento a favor da apresentadora do SBT. A alegação contrária gira em torno dos limites dessa liberdade.

Esses limites começam quando a comunicação afeta os Direitos Fudamentais de terceiros – direito à vida, dignidade, privacidade, honra, etc.

Certo. Considerando que o MP entrou com ação contra as declarações de Rachel, é possível deduzir que o órgão não vê possibilidade de enquadrar o caso nos limites da liberdade de expressão.

A questão-chave, portanto, é determinar se as declarações de Rachel afetaram ou não os direitos de terceiros.

Para isso, é aconselhável lembrar que o jornalismo tem o papel de formar a opinião pública.

Não existem dúvidas de que as publicações da imprensa condicionam o imaginário e as 
opiniões da sociedade. Assim sendo, o jornalismo é uma profissão que envolve enorme responsabilidade.

Entendendo isso, é importante lembrar que as declarações da jornalista não motivaram as ações dos justiceiros diretamente, pois ela não convocou a sociedade a atacar bandidos com paus e pedras.

Mas quando chama o ato dos “justiceiros” de “legítima defesa coletiva”, a apresentadora transmite a ideia de “legitimidade”. Ou seja, ao usar essa expressão, a apresentadora diz que os cidadãos podem punir outra pessoa legitimamente.

Com isso, indiretamente trata de convencer sua audiência de que essa prática é “compreensível” e consequentemente aceitável. E nenhuma vingança é legítima ou aceitável em Estados de Direito.

O ataque prévio de um bandido pode ser um forte atenuante em muitos casos, mas somente em casos específicos será visto como algo que torna outro crime legítimo.

Portanto, essa expressão argumenta a favor da justiça com as próprias mãos.

E todo argumento trata de convencer os demais de que “aquilo” é positivo, correto ou, no mínimo aceitável do ponto de vista moral ou legal.

Dessa forma a jornalista incentiva uma prática violenta.

Esse comentário será escutado por espectadores que vão pensar por conta própria e formar sua própria opinião sobre o caso.

Alguns irão repudiar as declarações e terão a opinião de que todos – até os bandidos – merecem julgamentos realizados pela Justiça, que realmente é o único poder do Estado que realmente pode julgar e punir com verdadeira legitimidade concedida pelo poder da lei.

Outros irão escutar e concordar com as declarações da jornalista, acreditando que se trata de uma prática aceitável ou “legítima”.

Possivelmente haverá um momento em que estes cidadãos se encontrem diante de um suposto criminoso rendido. Nesse instante, irão soltar sua fúria – reflexo de uma sociedade violenta –, partindo para a agressão física, que também é crime no Código Penal.

Quando uma declaração produz efeitos que diminuem ou acabam com os Direitos 
Fundamentais de outras pessoas, ultrapassa os limites da liberdade de expressão.

No mesmo vídeo, Rachel reclama da ineficiência do Estado em conter a violência e da tentativa de desarmar o cidadão “de bem”. Esses comentários não afetam os direitos de ninguém e, por isso, entram no âmbito de proteção da liberdade de expressão.

Mas a jornalista ofereceu argumentos que pretendem transmitir a ideia de legitimidade para uma prática que também é crime.

É nesse sentido indireto que os comentários de Sheherazade são ilegais e perdem o amparo da liberdade de expressão.

E é por isso que o Ministério Público pede uma retratação pública do SBT, sob pena de 500 mil reais por dia.

Segundo notícia do UOL, a emissora deverá dizer que “as ações dos justiceiros são ilegítimas e que, quando praticadas contra adolescentes, constituem crime ainda mais grave do que furtos”.

Dessa forma a jornalista poderá retificar a expressão “legítima defesa coletiva”, que incentiva a violência ao oferecer um ponto de vista favorável a práticas completamente inaceitáveis num estado de Direito.

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